Roberto Palmieri: Em Entrevista, o ex-goleiro fala sobre sua trajetória e relação com o treinador Zagallo - Juliana Rangel

Roberto Palmieri: Em Entrevista, o ex-goleiro fala sobre sua trajetória e relação com o treinador Zagallo

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O ex-goleiro Palmieri relembra os dias em que recusou propostas milionárias do Flamengo e Palmeiras durante sua época no Bangu

Roberto Palmieri, tem formação em orientação educacional, com pós-graduação em gestão e inteligência competitiva. Palmieri se destaca como radialista, treinador de futebol, coodernador técnico e gestor técnico de futebol profissional certificado pela Conmebol. Com registro no CREF/SP como técnico em desporto.

Juliana: Você encerrou sua carreira, mas ainda permaneceu um pouco no meio, principalmente na parte técnica, agora mais focado na coordenação. Enfim, um ensinamento, não é?

Palmieri: Eu sou presidente da Associação Nacional dos Treinadores de Goleiro na FBF. Eu sou um dos diretores da BTG, que é a Federação Brasileira dos Treinadores de Futebol. Como assim, Dorival Jorginho é uma federação criada para cuidar dos interesses dos treinadores de futebol no Brasil e a BTG dos treinadores de goleiro. Então, há um vínculo na comunicação que é peculiar a nós dois, não é? Eu sempre falo que fui jogador por acidente porque gosto muito da comunicação. Então, até hoje, trabalho com isso também.

Juliana: Você comentou que, para você, quando começou a carreira, era algo de outro mundo, né? Porque, geralmente, os goleiros daquela época tinham cerca de 1,80m, e hoje inverteu, né? Hoje, 1,80m nem passa em um teste, né? Você estava comentando…

Palmieri: Eu sofri preconceito por ser grande quando iniciei. Hoje, os goleiros baixos sofrem preconceito por serem baixos. Eu tive que vencer uma barreira para provar que eu era bom, apesar do tamanho, a mesma barreira que o goleiro pequeno tem que provar para ser reconhecido. Quando entrei, havia a esperança de que um goleiro grande era muito bom e daria certo, porque o futebol exigia essas aptidões. Você tinha que ser grande, forte, ter velocidade e potência, o que era uma desvantagem para quem queria jogar na posição abaixo, porque os clubes não se interessam mais se você não tem altura. Então, há muito talento que se perde porque já se criou esse estigma, os clubes não querem, o mercado não absorve mais o goleiro pequeno.

Juliana: Me fala uma coisa, você começou a base e cresceu no Rio de Janeiro, no time do Bangu. Não tem como não falar desse momento da trajetória no Bangu sem lembrar do Zagallo na época como técnico, até porque ele morreu recentemente, né? Eu queria que você falasse um pouco do que você lembra daquela época, da sua relação com o Zagallo.

Palmieri: Ju, não dá para falar do Zagallo sem considerar uma coisa. Tem muito colega do futebol que se projetou muito bem, reconhecido internacionalmente, que ninguém vai dizer que o cara é ruim, mas que não tem 10% da moral do que o Zagallo conseguiu construir na carreira que teve. Porque não foram só as vitórias, os títulos, era o que ele representava.

Juliana: Você sempre teve a ideia de seguir essa carreira no futebol, no esporte. Fala um pouco da sua história lá atrás, quando começou.

Palmieri: Eu ia fazer o Colégio Militar, mas meu pai também gostava muito de futebol, assim como a maioria das pessoas. Inclusive, nesses aplicativos de peladinha, os goleiros são fixos, você paga para o cara ser goleiro porque ninguém quer ir para o gol. Quatro na linha, e os goleiros são pagos para jogar. Eu já comecei no gol e, geralmente, vai para o gol quem não é bom na linha. Eu nunca tentei jogar na linha, fui direto para o gol porque amava ser goleiro, para mim é a posição mais bonita que tem no futebol. Eu me especializei, é o que eu entendo mais, né? E costumo dizer que o goleiro é uma raça diferente, porque é uma área de sofrimento. É uma posição de sofrimento, assim como árbitro, que é muito difícil. São posições difíceis no futebol, treinador de futebol é muito difícil, entendeu? Quando você é atleta, são você e mais 30, mas quando você é treinador, é você cuidando de 30.

Juliana: Você vem de uma família humilde?

Palmieri: Sim, mas assim, meu pai, eu até falo com as minhas irmãs, né? Eu tenho três irmãs, tá? Eu sou o único homem e sou o mais velho. Meu pai era professor. Então, apesar de eu ser de família humilde, meus pais sabiam exatamente o que estavam fazendo. Eu fui criado em um lar onde se alimentava direito, se entendia as coisas e se buscava a verdade. Você tá entendendo? E a gente vê, infelizmente, que, por força da condição da pessoa, às vezes, ela se sujeita a viver em condições precárias no que diz respeito ao conhecimento e ao acesso à informação. Então, você pode, vou dar um exemplo básico, você pega uma pessoa que não foi alfabetizada de forma correta, mesmo na fase adulta, ela vai ter dificuldade de pronunciar algumas palavras e colocar a gramática, né, de forma correta, e aquele que foi alfabetizado direitinho, mesmo que ele não seja um expert em alguma coisa, quando ele fala, essas palavras são colocadas de forma correta. Tô falando só do emprego do português, você imagina nas outras coisas a dificuldade.

Juliana: Você começou no Rio, né? E depois você foi passando por alguns outros times. Mas você veio para Ribeirão Preto também, onde inclusive nós falamos que você fixou sua residência e tudo mais. Como foi essa trajetória para você desses 20 anos?

Palmieri: Eu não me arrependo de absolutamente nada. Eu precisava viver tudo que eu vivi para estar aqui hoje com você, né? Eu tenho essa convicção, né? Que a gente é resultado das nossas experiências, então eu sou muito grato a Deus por ter me trazido para cá, por ter conhecido a minha esposa, meus filhos terem nascido aqui. Eu tive a oportunidade de estar no Botafogo, mas também joguei no Comercial. Tive essa experiência maravilhosa na melhor fase do Comercial, quando o time estava na primeira divisão do Paulista. Eu coordenava a base e os trabalhos no profissional.

Juliana: E tem algum jogador que marcou sua trajetória? Algum colega que foi extremamente importante para você?

Palmieri: Foram muitos. Eu não tive nenhum que você fala, “Ah, esse aqui é uma referência.” Eu não tive uma referência, todos contribuíram de alguma forma para engrandecer minha capacidade dentro do campo e como ser humano também. Tive alguns colegas, como o Márcio Rossini, que era um zagueiro de seleção brasileira. Outro foi o Mauro Galvão, jogadores que marcaram época. Eu poderia falar do Cláudio Adão, um atacante muito conhecido, e do Arturzinho, que também foi uma referência, pessoas corretas, de caráter.

Juliana: Tinha algum jogador que você não gostava muito?

Palmieri: Tinha, mas é normal. Na minha época a gente resolvia no braço, parava, no outro dia tava junto, vamos jogar. O futebol é um tipo de contato, né? A relação com o tempo se desgasta. Qualquer relação com o tempo se desgasta. O jogador só se preocupa em entrar e jogar, não é mesmo? Tinha nada disso, não tinha ninguém para intermediar absolutamente nada. Você tinha que resolver, e o treinador era o cara. Hoje também é importante, faz a gestão de grupo, mas antigamente todos esses problemas caíam sobre o ombro dele. Se não conseguisse absorver, o que fazia? Catava os dois que brigaram, um olho roxo aqui, outro olho roxo lá, e aí eu preciso de vocês dois, como é que vocês vão resolver isso? Vamos continuar brigando? Eu vou ter que abrir mão de vocês dois, vocês vão fazer as pazes, e nós vamos em frente, vamos apertar a mão um do outro e os dois depois arrumam briga com o terceiro do outro time. Isso é o futebol ainda.

Juliana: Na sua época, já era um bom salário?

Palmieri: Nunca foi. Se você for comparar o salário de um treinador, de um jogador de futebol com o trabalhador comum, era sempre diferente. Jogador sempre ganhou mais. Clube médio para cima ganha igual o pior trabalhador. Isso pode garantir, 98% dos jogadores de futebol ganham o que um trabalhador ganha. A gente está falando de cinco, seis, sete mil, que é um bom salário pensando no trabalhador normal. Mas pensando na carreira, aos 30 anos, você está pensando em encerrar, é pouco, porque você sai do futebol, vai fazer o quê? Hoje, a maioria está muito melhor. Na minha época, era pior porque poucos estudavam.

Juliana: Me fala, você chegou a ter proposta do Flamengo e do Palmeiras?

Palmieri: Quando eu era do Bangu, tive.

Juliana: E você recusou, né?

Palmieri: Antigamente existia uma coisa chamada contrato de gaveta. O clube fazia o contrato profissional e ele era seu dono. Hoje é diferente, com a Lei Pelé. Ela foi uma carta de alforia, porque fez com que os clubes tivessem que fazer um contrato temporário, um ano, dois anos. Quer dizer, antes, assinava-se contrato de gaveta, eu botava na gaveta. O Palmeiras e o Flamengo fizeram proposta. O Grêmio fez proposta, e o Castor de Andrade, que era dono do time, recusou na época. Eu lembro disso, nem que fossem uns 100 mil dólares, que era muito dinheiro na época. Hoje não é isso tudo, né? É um belo dinheiro.

Confira a entrevista completa no nosso canal do Youtube:

Juliana: Quando você estava no Bangu, você tinha à frente o Castor de Andrade?

Palmieri: Tinha um presidente estatutário, como eu falei. Ele era o patrão, aparecia lá de vez em quando para assistir a um treino ou outro, mas não ficava lá prestando nenhum tipo de serviço ou atenção. Ele era o cara. Era um contraventor, envolvido em jogos de bicho no Rio de Janeiro, assim como outros. Mandava até hoje. Como era antigamente, valia o que estava escrito, porque se você apostasse lá X no bicho tal e chegasse com papel, você ia receber. Não tinha essa de “Ah, não, você recebe assim”. Era assim, eu não fiz o bigode. Os banqueiros, esses contraventores, andavam em determinadas áreas no Rio. Então, não tinha só o Castor. Hoje, as escolas de samba também têm muita contravenção com os seus patronos bancando as escolas. Hoje mudou um pouco, tá mais profissional e tal, mas o Rio de Janeiro é um estado atípico, é um estado atípico em relação a isso. Se você for comparar hoje, qual a diferença entre o que o Castor fazia antes e esses pontos da vida hoje? É tudo jogo de azar.